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Como o Mapa evitou que feijão contaminado fosse parar em nossas mesas

Débora Damasceno
Débora Damasceno
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#souagro| No fim do mês passado nós mostramos aqui no portal Sou Agro que uma ação conjunta do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e do Instituto de Defesa Agropecuária do Estado de Mato Grosso (Indea-MT) terminou com a apreensão de 4,2 mil toneladas de feijão-caupi, também chamado de feijão-de-corda, com resíduo de agrotóxico proibido.

A fiscalização foi em Campo Novo do Parecis (MT), e é a maior suspensão de comercialização feita pelo Ministério. A mercadoria é referente à safra de 2021 e equivale a 140 carretas carregadas com o produto. Em conversa com a jornalista Débora Damasceno, o coordenador-geral de Qualidade Vegetal do Mapa, Hugo Caruso falou sobre como as equipes chegaram até a carga. “O feijão não tinha problemas com resíduos de agrotóxicos até 2018, o Feijão sempre teve um nível de conformidade muito alto. Porém, em 2019, ele apontou 90% de inconformidade no feijão Vigna e 32% no Fazelos. Então estava muito alto e isso chamou muita a nossa atenção e aí nós começamos a tratar disso com o setor, mas não estava surtindo muito efeito e os números continuavam altos. Em 2020 nós passamos a fazer uma fiscalização e nós passamos a autuar os embaladores de feijão. Você está colocando no mercado o feijão que está com resíduo acima do limite permitido, como nós não temos a rastreabilidade até o agricultor, quem é responsável pelo produto é o embalador e isso que gerou dentro do  setor foi que as empresas para não serem penalizados começaram a fazer testes no controle da matéria prima”, explicou Caruso.

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Com a fiscalização mais intensa do Mapa, as empresas embaladoras também ficaram mais rigorosas no controle de qualidade e não aceitavam mais produtos que estavam fora dos padrões e foi assim que as equipes chegaram até essa grande carga irregular: “Muitas empresas começaram a refugar  esses produtos e nós tínhamos a indicação de que no Mato Grosso realmente era local onde estava tendo muita produção, no caso do Vigna que estava forados limites aceitáveis. E e aí diante dessas informações obtidas com vários embaladores é que a gente acabou chegando a essa empresa no no Mato Grosso. Essa empresa ela tentou comercializar o produto no ano passado e como foi refugado pelas embaladores ela acabou recebendo de volta, ela não conseguia comercializar o produto. E ela ficou com esse produto estocado na expectativa de que baixassem os limites. Então nós com essa informação, a gente só tem uma certeza os agricultores não utilizaram as boas práticas agrícolas e por isso o feijão apresenta esse índice mais alto. Então são coisas que começaram lá atrás que hoje já está estão dando efeito. Então essa suspensão da comercialização, ela foi resultado de ações que começaram em 2019 e então a gente conseguiu evitar que 5 milhões de quilos fosse parar no prato dos brasileiros”, disse Hugo.

De que maneira a carga poderia ser utilizada?

Mas uma grande dúvida que surge é o que será feito com toda essa carga de feijão, afinal são milhares de quilos do produto parados em um barracão. Para Hugo, essa é uma questão complicada e difícil de ser respondida: “Estamos tratando um produto que a gente não tem muitas possibilidades de utilização. O primeiro seria aguardar mais um tempo e verificar a possibilidade de degradar os resíduos por mais algum tempo. A segunda seria para alimentação animal, mas não sei quais animais poderiam utilizar esse produto, eu imagino que poderia ser utilizado para alimentação animal dependendo da cadeia. Como é feijão é difícil, porque se fosse algum outro produto poderia ser utilizado pra fabricação de óleo que as vezes acaba não não transferindo a molécula
ou pra algum outra transformação, mas nesse caso é bem difícil”, explica Hugo.

Infelizmente se nenhuma das alternativas puder ser utilizada, todo esse feijão terá que ser destruído, o que segundo Hugo é lamentável e poderia ser evitado: “Nós tivemos já diversas situações
de exportação de feijão que foram detectados resíduos lá no país de destino e isso assim é muito ruim pro Brasil. Ainda mais o Brasil que nós estamos num processo de estreitar esses relacionamentos com os países. Só que na medida que a gente tem um feijão que eles detectam que está com resíduo é muito ruim. E nós tivemos já várias cargas que foram exportadas e retornaram pro Brasil. E a única solução que nós encontramos foi a destruição. É triste. Né? Você ter que jogar, já acompanhamos destruição de contêineres com mais 100 toneladas de feijões que tiveram que ir pro lixão, porque estão com resíduo de agrotóxico acima do permitido. Então assim, um país que tem muita gente ainda passando fome, nós temos que destruir alimento, isso é ruim demais. Mas não tem outra solução, a gente não pode colocar esse produto pra ser consumido porque ele realmente pode oferecer algum risco”, detalha Caruso.

 

Qual o motivo do agrotóxico encontrado nos feijões ser proibido no Brasil?

Hugo detalha o motivo do glifosato ser proibido e como é feita a aprovação para o uso de defensivos: “No Brasil para ser utilizado algum produto ele precisa de registros e quando você faz o registro você tem que mostrar o quanto ele é seguro. Então são feitos testes para mostrar que ele é seguro naquela dosagem e não vai deixar resíduos que comprometam a saúde. Então é feito um uma avaliação pela ANVISA de acordo com a dieta do brasileiro, de acordo com a dose recomendada para obter o sucesso lá na na na lavoura. Então assim, dentro do registro do glifosato não existe a a possibilidade de utilizar ele na pré-colheita. O limite que  está autorizado para o glifosato ele é muito baixo, porque você não tem esse estudo e quanto que ele poderia ter de resíduo no feijão. Então ele não tem registro para essa aplicação. Teria que a empresa solicitar um estudo de avaliação para verificar. O limite hoje 0,05, será que com o limite de 2 ele é seguro, teria que provar isso e a gente não sabe. Então teria que fazer uma alteração de registro. Eu acho um pouco provável porque nenhum lugar se utiliza aplicação de glifosato para esse fim”, explicou.

Há um outro produto que vem sendo encontrado nos levantamentos e gera preocupação, ele não é proibido, mas pode estar sendo utilizado em excesso ou de maneira errada: “O outro produto é o glufosinato de amônia ele é permitido, entretanto ele já já tem um estudo pra dizer qual que é o limite. Só que os agricultores acabam utilizando um uma dosagem mais alta ou estão utilizando de forma incorreta o produto e mesmo assim está apresentando resíduo. Então nesse caso teria que fazer uma reavaliação do produto para verificar o que que está acontecendo que os agricultores mesmo tendo registro eles estão encontrando. Não é o caso dessa apreensão agora, nessa apreensão basicamente o problema foi glifosato. Mas nos nossos levantamentos que a gente tem feito, a gente tem percebido também a presença do glufosinato de amônia”, detalha Caruso.

 

É possível localizar os responsáveis pela contaminação da carga?

Questionado se é possível encontrar os responsáveis pela carga apreendida, Hugo diz que será difícil, mas que isso vai servir de lição para as próximas safras: “Vai ser muito difícil conseguir penalizar nesse momento os agricultores. Estamos falando de uma safra que ocorreu há mais de um ano, então vai ficar o alerta para o INDEA no Mato Grosso sobre a irregularidade. Então isso pode auxiliar o INDEA nas fiscalizações agora, nas futuras safras, possibilita que eles acompanhem de perto e verifique se o agricultor está utilizando de forma correta o agrotóxico sem termos prejuízo lá no produto final. Não queremos penalizar o agricultor, não queremos penalizar embalador de forma alguma, a gente quer resolver o problema. Então eu acredito que que o resultado de tudo isso que desta investigação vai levar o INDEA a estabelecer uma estratégia de fiscalização pra evitar o problema. Porque todo agrotóxico, para ser comercializado ele precisa de um receituário agronômico. Então tem existe controle da comercialização do produto. Quem é que está comprando? Quem é que está comercializando? Pra que cultura que ele está sendo utilizado? Então há ferramentas hoje disponíveis para evitar com que o agricultor utilize de forma irregular. Então eu acho que nesse momento vai ser complicado realmente identificar”, detalha Hugo.

Qual lição e alerta foram deixados por esta apreensão ?

“Eu acho que principal que a gente conseguiu atingir com essa notícia, triste notícia, eu acho que tem esse fator de alerta pro para os agricultores, para toda a cadeia do feijão. O negócio é seguir realmente as regras, por mais que seja um pouco mais caro, mas quem utilizou corretamente o produto não tá tendo problema. Quem está tendo problema, se o agricultor não está ainda conseguindo enxergar o problema, as empresas vão começar aumentar os seus controles e ele vai ter problema. Eu acho que o alerta ele foi dado né? A gente precisa melhorar ainda e proteger a nossa sociedade e proteger o próprio setor. Porque fica muito ruim você ter uma mensagem dessas que o feijão está contaminado, e a gente quer que aumente o consumo, não diminua por receio. A gente viu muitas vezes notícias de resultado dos programas dado de uma forma não correta e que desestimulava o consumo”, detalha Hugo.

Para finalizar Hugo fala sobre as lições deixadas com esta apreensão: “Eu vejo três situações que a gente consegue. Primeiro uma articulação com o órgão do Mato Grosso, isso pra nós assim foi fundamental. O segundo a mudança do setor de estar iniciando esse processo de controlar a produção, porque sem o setor realmente abraçar essa causa é impossível pra nós do governo, conseguir controlar. Então precisa realmente as empresas fazerem o seu papel. E a terceira lição positiva que eu vejo é que a gente conseguiu, por mais que a gente tenha dificuldade a gente conseguiu evitar que cinco milhões de quilos de feijão fosse parar no prato dos brasileiros”, finaliza Hugo.

(Débora Damasceno/Sou Agro)

(Foto: Mapa)

 

 

(Débora Damasceno/Sou Agro)

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