Greve da Receita Federal pode prejudicar pão francês
Cargas paradas nos portos há quase três meses. Navios sem espaço para desembarcar mercadorias. A operação-padrão dos auditores da Receita Federal tem travado a importação de insumos e prejudicado a produção de produtos que vão desde o pão ao sabão em pó.
Servidores da Receita Federal permanecem em greve, há pelo menos 3 meses, que desencadeia em impactos de produtos agrícolas. Mais de 38 mil toneladas de trigo importado estão paradas no porto de Santos. Para seguirem destino de distribuição, precisam de liberação do órgão público.
O cenário levou o Instituto Brasileiro de Comércio Internacional e Investimentos (IBCI) a enviar um ofício ao ministro da Economia, Paulo Guedes, pedindo soluções para resolver o problema envolvendo os servidores públicos e o escoamento de cargas.
“O comércio exterior brasileiro é um fator chave para a retomada da economia nacional no pós-Covid 19. O atraso nas atividades portuárias vai na contramão de tal objetivo. Desta maneira, reforço o apoio do IBCI e das empresas que assinam este documento para que o tema seja tratado com a devida seriedade, novamente, evitando um efeito dominó dentro da economia nacional, que luta para uma recuperação cada vez mais promissora”, diz o ofício que é assinado pelo presidente da entidade, Welber Barral.
De acordo com o Sindicato da Indústria do Trigo de São Paulo (Sindustrigo) a demora para a liberação não se justifica. A carga presa nos silos é de origem argentina, dentro dos acordos do Mercosul, “importada por moinhos que fazem esse movimento há mais de 20 anos, ou seja, não temos um fator novo que justifique o atraso na operação que, em tempos normais, levaria de 3 a 5 dias para ser concluída”, disse o presidente do Sindustrigo, Valnei Origuela.
Ainda no documento, o IBCI lembra de outras dificuldades que o setor portuário vem enfrentando para o escoamento de mercadorias, onde cargas estão levando quatro vezes o tempo normal para ter seu desembaraço em regiões aduaneiras.
“Esses atrasos afetam não somente os operadores que tratam diretamente com exportações e importações, mas também pequenas empresas que possuem operação exclusiva no Brasil, que dependem de componentes importados. Prazos de desembaraços que demorariam normalmente de até 5 dias atualmente estão levando semanas”, ressalta a nota.
Desde o fim do ano, servidores do fisco fazem paralisações e seguram cargas como forma de pressionar o governo federal para recompor o orçamento do órgão e regulamentar um bônus de eficiência pago aos auditores. O movimento teve início depois de o presidente Jair Bolsonaro prometer reajustar o salário de policiais federais, o que desencadeou greves também entre servidores do Banco Central, Tesouro Nacional, INSS e analistas de comércio exterior.
Pão francês e sabão em pó serão prejudicados
A demora da Receita Federal em liberar cargas importadas pode levar a um aumento do preço do pão francês e fazer faltar nas prateleiras sabão em pó e amaciante. Diversos setores da economia dizem estar sendo prejudicados pelo movimento dos auditores fiscais, entre eles alimentos, higiene e limpeza, bens de consumo, automóveis e varejo.
De acordo com o diretor-executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Produtos de Higiene, Limpeza e Saneantes (Abipla), Paulo Engler, há relatos de empresas associadas que aguardam a liberação pelo Fisco de insumos que chegaram ao Brasil há meses.
Um grande fabricante de produtos de limpeza que pediu anonimato aguarda a liberação de matéria-prima há 83 dias. “Já há partes da produção paradas, parte dos reagentes, parte dos laboratórios. Estamos com receio de que podemos ter problemas em toda linha de produção. O atraso está grande demais e acendeu uma luz no setor, que pode sofrer interrupção se não houver liberação rápida”, afirmou.
Movimento ‘inevitável’
O presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais (Sindifisco), Isac Falcão, disse que o movimento é “inevitável” para evitar que se perpetue a situação atual, em que o governo cortou em 50% o orçamento da Receita neste ano.
Apesar das filas nas aduanas, ele diz que o governo segue “fechado ao diálogo”. “Dizem coisas genéricas, que entendem nossos pleitos como importantes, justos, razoáveis. Mas não dão prazo para resolver os problemas”, completou.
(Ageié Machado/Sou Agro com agências)