Produtores de leite enfrentam cenário desafiador

Débora Damasceno
Débora Damasceno

Desde setembro de 2021, observa-se que o enfraquecimento do consumo por lácteos tem ditado os movimentos de preços para toda cadeia produtiva. As consecutivas quedas nos valores dos derivados nas negociações entre indústrias e canais de distribuição vêm sendo transmitidas também para o produtor no campo. O último dado fechado pelo Cepea mostra que o preço do leite captado em dezembro/21 e pago aos produtores em janeiro/22 chegou a R$ 2,1093/litro na “Média Brasil” líquida, recuos de 1,1% em relação ao mês anterior e de 6,1% frente ao mesmo período de 2021, em termos reais (deflação pelo IPCA de janeiro/22). Contudo, pesquisas ainda em andamento do Cepea apontam para a inversão desta tendência dos preços a partir da captação realizada em janeiro.

As consecutivas baixas nos preços ao produtor nos últimos meses têm comprometido os investimentos dentro da porteira e reduzido a oferta de leite. O Índice de Captação de Leite do Cepea (ICAP-L) registrou queda de 1,9% de novembro para dezembro. Dados recentes da Pesquisa Trimestral do Leite do IBGE apontam que a captação das indústrias caiu 3,6% do terceiro para o quarto trimestre de 2021, recuo de 5,7% em relação ao mesmo período de 2020.

 

Os efeitos do fenômeno La Niña, com fortes chuvas no Sudeste e estiagem no Sul, têm impactado diretamente a produção de leite, visto que a baixa qualidade das pastagens e da silagem prejudica a alimentação do rebanho. Além disso, é preciso considerar que a oferta de grãos também tem sido afetada negativamente pelo clima – o que também eleva o preço deste insumo. Em janeiro, o poder de compra do pecuarista frente ao milho diminuiu 9,7%. Para piorar, os preços de outros insumos, como suplementos minerais, antibióticos, adubos e corretivos, continuaram se elevando, corroendo a margem do produtor de leite. Nesse contexto, os investimentos na pecuária leiteira têm sido comprometidos, com perda no potencial produtivo do País.

Ao mesmo tempo, as importações em baixa e as exportações de leite em pó em volumes 15 vezes acima do registrado em dezembro/21  ajudaram a controlar os estoques de lácteos das indústrias. Não é de surpreender que, apesar da queda nos preços do UHT e da muçarela, o leite em pó (400g) tenha se valorizado em janeiro. Nesse sentido, o preço do leite captado em janeiro e pago aos produtores em fevereiro pode refletir esse novo cenário de valorização da matéria-prima.

 

O acompanhamento do Cepea do mercado spot (leite negociado entre indústrias) mostra que a disputa das indústrias por matéria-prima se acirrou fortemente nas últimas três quinzenas. Em Minas Gerais, o preço médio saltou de R$ 2,03/litro na segunda quinzena de janeiro para R$ 2,43/litro na segunda metade de fevereiro, valorização de 19,6%. Os resultados sugerem, assim, um adiantamento do período da entressafra e a tendência de alta nos preços ao produtor para os próximos meses.

LEITE

 

leite

 

Com demanda enfraquecida, setor recorre às promoções para garantir liquidez em janeiro

Os preços do leite UHT e do queijo muçarela recuaram no primeiro mês de 2022 no atacado de São Paulo. Segundo pesquisas realizadas pelo Cepea com o apoio da OCB (Organização das Cooperativas Brasileiras), os preços médios fecharam em R$ 3,18/litro para o leite longa vida e em R$ 24,12/kg para a muçarela, 0,6% e 2,2% inferiores ao observado no mês anterior. Em relação ao mesmo período de 2021, as desvalorizações foram de 4,33% e 7,72%, respectivamente, em termos reais (valores deflacionados pelo IPCA de janeiro/22).

 

Segundo colaboradores do Cepea, o movimento baixista esteve atrelado à maior concorrência entre os laticínios e à necessidade de promoções para assegurar liquidez, visto que a demanda está enfraquecida. Com a menor procura por lácteos desde as festas de fim de ano, agentes relataram dificuldades em repassar a alta dos custos de produção de derivados para o consumidor final, além da pressão dos canais de distribuição por cotações mais baixas em janeiro.

Em contrapartida, o preço do leite em pó (400g) apresentou média de R$ 24,51/kg em janeiro, aumento de 2,9% frente ao último mês de 2021, mas diminuição de 3% em relação ao mesmo período do ano anterior. Os estoques mais baixos tanto nas indústrias quanto nos canais de distribuição, além da expectativa dos agentes pela volta às aulas e demais atividades presenciais, sustentaram os valores.

FEVEREIRO

Pesquisas ainda em andamento sinalizaram alta nos preços do leite UHT, do queijo muçarela e do leite em pó (400g) na parcial deste mês, com médias parciais (de 1º a 15/02) de R$ 3,34/litro, R$ 24,15/kg e R$ 25,02/kg, respectivamente – avanços de 5%, 0,1% e 2,1% em relação a janeiro/22, na mesma ordem. De acordo com agentes, o aumento se deve à menor oferta de leite e à consequente elevação dos preços da matéria-prima no campo.

LEITE

 

Ano se inicia com baixa nas importações de lácteos

2022 começou com baixa na aquisição brasileira de derivados lácteos. As reduções no volume importado foram de 23,3% de dezembro/21 a janeiro/22 e de 51,6% em relação a janeiro/21, com total de 8,7 mil toneladas no primeiro mês do ano – segundo dados da Secex. O recuo das importações está atrelado à baixa demanda do mercado interno, visto que o poder de compra da maioria dos brasileiros permanece enfraquecido. Ademais, os altos patamares de preços negociados no mercado internacional desestimularam a compra de lácteos.

De acordo com a Secex, o volume de leite em pó adquirido (que representou 58% das compras totais) diminuiu 12% frente a dezembro e 59% na comparação com o primeiro mês de 2021, totalizando 5,05 mil toneladas. Os principais países vendedores desse produto ao Brasil foram a Argentina (67,7%) e o Uruguai (34,3%). Quanto aos queijos (com total de 21% das compras), o volume importado recuou 29% frente a dezembro/21 e 48,8% frente ao mesmo período de 2021, totalizando 1,8 mil toneladas. A Argentina e o Uruguai também apresentaram maior participação sobre a aquisição dos queijos, com participações de 34,4% e 21,6%, respectivamente.

 

Quanto às exportações, totalizaram 3,4 mil toneladas em janeiro, 4,5% menor que o volume de dezembro/21, mas 30% superior ao de janeiro/21, também conforme a Secex. Apesar do recuo no total embarcado, as vendas do leite em pó avançaram de forma expressiva entre dezembro e janeiro, registrando volume 15 vezes superior ao de dezembro/21 e 30 vezes maior que o do mesmo período de 2021, totalizando 937 mil toneladas. O principal destino do derivado foi a Argélia, que foi responsável por 96,4% dos negócios.

O segundo produto mais negociado foi o leite condensado, com 667 toneladas exportadas, mas com quedas de 41,7% frente a dezembro/21 e de 38,1% na comparação anual. Os principais destinos do derivado foram Chile, Cuba e Trinidad e Tobago que, juntos, representaram 61,5% das vendas de leite condensado.

BALANÇA COMERCIAL

No primeiro mês de 2022, o saldo da balança comercial de lácteos fechou com déficit de US$ 21,5 milhões, baixas de 32,3% frente a dezembro/21 e de 57% em relação ao mesmo período de 2021. Em volume, o déficit foi de 5,3 milhões de toneladas, 32% menor frente ao mês anterior.

LEITE

 

Aumento no custo e queda na receita pressionam margens em janeiro

No primeiro mês de 2022, os custos de produção da pecuária leiteira avançaram, enquanto a receita recuou, cenário que pressionou as margens de produtores. O COE (Custo Operacional Efetivo) avançou 1,68% em janeiro na “Média Brasil” (BA, GO, MG, PR, RS, SC e SP). Os grupos de custos que mais influenciaram essa alta no primeiro mês de 2022 foram os Suplementos Minerais, com elevação de 2,54%, seguido dos Medicamentos Antibióticos (+ 2,35%), Adubos e Corretivos (+0,89%) e Concentrados (+0,57%).

O item Mão de Obra também impulsionou o aumento nos custos, com alta de 8,21% na “Média Brasil” entre dezembro e janeiro, devido à correção do salário mínimo nacional de R$ 1.100 para R$ 1.212. Diante desse cenário, a receita caiu, o que pressionou as margens dos produtores de leite no início deste ano.

 

Quanto ao grupo de Suplementos Minerais, os preços dos fretes e de produtos como vitaminas e fosfatos continuam sendo os responsáveis pelos reajustes positivos, segundo colaboradores do Cepea. Dentre os estados pesquisados, Minas Gerais foi o que apresentou o avanço mais expressivo no período, de 5,41%, seguido de Santa Catarina (+1,97%) e São Paulo (+1,73%). O grupo de Adubos e Corretivos registrou alta de 0,89% em janeiro na “Média Brasil”, sendo o 12º mês consecutivo de aumento para esse item. Neste caso, o impulso está atrelado à restrição de oferta das matérias-primas essenciais (como potássio, fosfato e ureia), ao dólar elevado e ao encarecimento dos fretes.

Na “Média Brasil”, os concentrados registraram valorização de 0,57% em janeiro, reflexo do aumento nos preços dos grãos. A seca no Sul e o excesso de chuvas no Centro-Norte do Brasil trouxeram incertezas quanto à produtividade da safra 2021/22, elevando os preços, além dos baixos estoques internos. Em janeiro, a média do Indicador ESALQ/BM&F Bovespa – Paranaguá da soja subiu 5,53% e, para o milho (Indicador ESALQ/BM&FBovespa, Campinas/ SP) avançou 9,10%. Os estados com as altas mais significativas para os concentrados foram São Paulo (+5,43%), Santa Catarina (+2,00%) e Goiás (+1,49%).

Em janeiro, o poder de compra do produtor de leite frente ao milho diminuiu em razão da valorização do cereal. Em Campinas (SP), foram necessários 45,53 litros para a aquisição de uma saca de 60 kg do milho, contra 41,50 litros no mês anterior. O preço do leite (Média BR), por sua vez, recuou 0,55%, indo de R$ 2,1210 em dez/21 para R$ 2,1093 em janeiro/22.

 

(Fonte: Cepea)

 

(Débora Damasceno/Sou Agro)

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