Microrganismos são capazes de reduzir temperatura das plantas

Amanda Guedes
Amanda Guedes

Uma pesquisa conduzida pelo Centro de Genômica Aplicada às Mudanças Climáticas (GCCRC), iniciativa da Embrapa e da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), demonstrou que microrganismos podem reduzir a temperatura das plantas. Os cientistas demonstraram que a presença de uma comunidade sintética desses pequenos seres vivos foi capaz de reduzir em até quatro graus a temperatura foliar de plantas de milho submetidas a altas temperaturas.

O estudo Modulating drought stress response of maize by a synthetic bacterial community (Modulando a resposta ao estresse hídrico do milho por uma comunidade bacteriana sintética) foi publicado na quinta-feira (21/10)  na revista Frontiers in Microbiology.

Por meio de uma sofisticada plataforma de coleta de dados em tempo real, os pesquisadores mostraram que os microrganismos ajudam a controlar o fluxo hídrico da planta e, portanto, a tolerância à seca. A descoberta abre caminhos para o desenvolvimento de novas biotecnologias agrícolas que podem garantir a segurança alimentar durante a transição para uma economia de baixo carbono.

Cada vez mais os cientistas têm descoberto que os fungos, as bactérias e as arqueas presentes no solo, raiz, caule e folha dos vegetais desempenham um papel fundamental no crescimento, produtividade e respostas das plantas em condições de variações ambientais, como seca e calor. O que ainda não se sabia é como essa interação ocorria e de que forma esses seres invisíveis afetavam as plantas.

Parte desses desafios decorre de limitações de metodologias para se medir o que ocorre nas plantas em tempo real. “Estratégias comumente usadas esbarram na impossibilidade de avaliar de forma contínua a resposta das plantas às flutuações do ambiente, ficando limitadas a poucas medições realizadas de forma pontual”, explica o biólogo molecular Jaderson Armanhi, pesquisador do GCCRC e autor do estudo.

Ferramenta sofisticada feita em casa

Para driblar esse problema, os cientistas construíram uma plataforma de sensores capazes de medir temperatura, fluxo de água, fotossíntese e vários outros parâmetros das plantas e do ambiente em tempo real. “Utilizamos múltiplos sensores não invasivos acoplados às plantas, sensores ambientais e câmeras fotográficas; todos com pontos de coletas de dados simultâneos”, conta Armanhi, que se enveredou no mundo da engenharia eletrônica para criar o aparato tecnológico necessário à coleta de dados em tempo real.

“Plataformas de fenotipagem comerciais de larga escala são estruturas complexas e de alto custo, o que limita seu uso a poucos laboratórios no mundo. A plataforma construída nesse trabalho mostra que é possível obtermos informações robustas, inéditas e, ainda por cima, economizando recursos”, avalia a pesquisadora da Embrapa Informática Agropecuária Juliana Yassitepe, coautora do artigo.

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Assim, foi montado um experimento usando dois grupos de plantas de milho: um com a inoculação de microrganismos previamente selecionados e outro sem. Ambos os grupos foram monitorados continuamente durante quatro meses (veja o vídeo abaixo). No fim, o estudo reuniu mais de cinco milhões de pontos de dados, 60 mil fotos e 500 plantas investigadas.

 

Usando abordagens da biologia computacional, os pesquisadores constataram que o grupo de plantas com os microrganismos selecionados teve a temperatura foliar reduzida em até 4°C. Isso porque as plantas inoculadas conseguiram otimizar o fluxo hídrico e a transpiração das folhas.

“Antitérmico” para plantas

“O aquecimento excessivo leva a disfunções das proteínas e outras moléculas das plantas, prejudicando seu crescimento. A comunidade de microrganismos sintéticos funciona como um ‘antitérmico’ da planta”, ilustra Paulo Arruda, professor da Unicamp e coordenador do Centro.

Os autores destacam que tanto as plantas inoculadas quanto as não inoculadas têm a mesma performance com relação à produtividade em condições normais de irrigação. Entretanto, diante de quadros de escassez hídrica, as plantas inoculadas tiveram uma produtividade três vezes maior.

“Vemos a inoculação como um ‘seguro’ da planta no caso de seca extrema. Diante do cenário de escassez hídrica, os microrganismos selecionados com base em sua robustez foram capazes de garantir a saúde da planta e reduzir as perdas ocasionadas pela falta de água”, pontua Armanhi.

Tecnologias de microbioma para agricultura

Os cientistas contam que os estudos sobre as contribuições dos microrganismos para a agricultura, saúde e meio ambiente caminham cada vez mais para abordagens sistêmicas, considerando o papel de todo o microbioma no meio, ou seja, os efeitos conjuntos de fungos, bactérias e arqueas em diferentes ambientes. “O que descobrimos foi a ponta de um iceberg. Há muito a ser explorado em relação aos potenciais benefícios que esses organismos oferecem em conjunto para agricultura, por exemplo”, conta Armanhi.

Segundo o relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre clima, a Terra está aquecendo antes do esperado. Entre as consequências citadas, estão ocorrendo eventos climáticos extremos em maior frequência, como enchentes e ondas de calor. Caso o cenário não se reverta, alguns dos efeitos diretos para países como o Brasil serão secas mais frequentes e a queda na capacidade de produção de alimentos, aponta a ONU.

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Para abordar esse desafio, o GCCRC está explorando novas fronteiras na biodiversidade brasileira. O grupo está investigando o papel do microbioma na nutrição e hidratação de algumas plantas dos Campos Rupestres e como isso pode ser aproveitado em novas variedades agrícolas. “Isso abre um novo horizonte para a ciência, para a biotecnologia e para a preservação desses hot spots da biodiversidade”, finaliza Arruda. Os Campos Rupestres são regiões localizadas no centro do País que abrigam plantas que se desenvolveram sob condições de seca severa e solos pobres em nutrientes.

FONTE – EMBRAPA

(Amanda Guedes/Sou Agro)

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