Cientistas desenvolvem técnica com infravermelho para identificar fungos em milho
Uma pesquisa desenvolvida pela Embrapa em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) conseguiu identificar fungos no milho do gênero Fusarium que acometem grãos por meio de um método inovador. Os cientistas combinaram imagens hiperespectrais de infravermelho próximo, técnica conhecida pela siga em inglês NIR, com métodos de reconhecimento de padrões e tiveram sucesso na identificação das espécies F. verticillioides e F. graminearum, os fungos que mais acometem os grãos de milho e responsáveis pela produção das principais micotoxinas nesse cereal. O primeiro é o principal produtor da micotoxina fumonisina e o F. graminearum está associado à zearalenona.
Micotoxinas são metabólitos tóxicos produzidos por algumas espécies de fungos presentes nos grãos. A toxidade das micotoxinas a animais e humanos tem como consequência a incidência de doenças diversas. Ao mesmo tempo, atualmente, a detecção dos fungos que as produzem envolvem processos caros e complexos dificultando sua aplicação. Por causa disso, há uma demanda de especialistas e de grandes indústrias por um método de identificação preciso e rápido para evitar essa contaminação por espécies de Fusarium.
“Buscamos obter um método não destrutivo, livre de produtos químicos e de execução mais rápida, o método de imagem hiperespectral de infravermelho próximo (Near infrared hyperspectral imaging – HSI NIR), associado à análise de imagem multivariada. Esse método foi desenvolvido para permitir uma leitura rápida da amostra, além de uma precisão maior na distinção dos patógenos”, conta a pesquisadora Maria Lúcia Ferreira Simeone, da Embrapa Milho e Sorgo (MG).
Ela ressalta que a identificação desses fungos patogênicos é uma etapa inicial importante de controle de doenças em milho, porém, os métodos mais tradicionais de diferenciação de espécies requerem um alto nível de conhecimento, técnicas laboratoriais de alto custo, além de consumirem bastante tempo na execução. Simeone acrescenta que esses patógenos são de difícil identificação e controle. “Por isso, a busca por métodos alternativos é de grande relevância para toda a cadeia produtiva do milho”, informa a cientista.
Para obter esse método foi desenvolvida uma tese de doutorado na UFMG, em parceria com a Embrapa Algodão e a Embrapa Milho e Sorgo. “Nosso objetivo foi utilizar a técnica de HSI-NIR e técnicas de análise multivariada de imagens combinadas com a de reconhecimento de padrões, como a discriminante de mínimos quadrados parciais (PLS-DA) de imagens. E assim desenvolver um método rápido para identificação de F. verticillioides e F.graminearum”, conta Simeone.
O trabalho foi apresentado ao Programa de Pós-graduação em Microbiologia do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG, pela doutoranda Renata Regina Pereira da Conceição. A estudante foi orientada pela professora Maria Aparecida de Resende Stoianoff e co-orientada pelas pesquisadoras da Embrapa Milho e Sorgo Maria Lúcia Simeone e Valéria Aparecida Vieira Queiroz.
Um problema da cadeia do milho
O milho (Zea mays L.) é um dos alimentos mais presentes na dieta humana e animal e possui grande importância econômica e social. A elevada importância socioeconômica do milho pode ser evidenciada pela expansão da área de cultivo e seu uso extensivo em diversos produtos para rações e alimentos, produção de biocombustíveis e matéria-prima para diferentes indústrias.
De acordo com a estimativa do décimo levantamento da safra 2020/2021, no ranking mundial de produção de milho, o Brasil ocupa o terceiro lugar, com 109 milhões de toneladas, precedido apenas pelos Estados Unidos e China, com produção de 360,3 e 260,7 milhões de toneladas, respectivamente. O Brasil é o quarto maior consumidor do cereal com 70 milhões de toneladas anuais.
Anualmente, 25% da produção mundial de grãos é acometida por micotoxinas, segundo estimativa da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) , conforme publicação dos autores Mari Eskola e equipe, na pesquisa Worldwide contamination of food-crops with mycotoxins: validity of the widely cited ‘FAO estimate’ of 25%, revista Food Science and Nutrition, em 2020 (Contaminação mundial de culturas alimentares com micotoxinas: validade da amplamente citada ‘estimativa da FAO’ de 25%).
Pesquisa realizada por Nicole J. Mitchell e sua equipe, em 2016, avaliou que a contaminação por aflatoxina pode causar prejuízos à indústria de milho que variam de US$ 52,1 milhões a US$ 1,68 bilhão anualmente nos Estados Unidos. A estimativa foi publicada no trabalho Potential economic losses to the US corn industry from aflatoxin contamination (Potenciais perdas econômicas para a indústria de milho dos EUA devido à contaminação por aflatoxina).
A pesquisadora da Embrapa Dagma Dionísia da Silva, coordenadora do projeto “Tecnologias para identificação, quantificação e mitigação de fungos toxigênicos e micotoxinas em grãos de milho” ressalta que “o milho é uma cultura altamente suscetível à infecção por fungos patogênicos”. “Essa infecção pode ocorrer tanto antes, quanto depois da colheita, comprometendo direta e indiretamente a qualidade dos grãos de milho e seus derivados, reduzindo sua qualidade sanitária e física, interferindo na sua classificação comercial e tornando os grãos impróprios para o consumo”, relata Silva.
“A contaminação de milho e de seus produtos com agentes microbiológicos patogênicos pode causar graves consequências aos consumidores, sendo motivo de grande preocupação em nível mundial. Por isso, nos últimos anos, a busca por alternativas para garantir a segurança dos alimentos tem sido o foco de ações internacionais”, complementa a pesquisadora da Embrapa Valéria Queiroz.
Fotos: Renata Silva (plantação de milho) e Dagma Silva (milho com sintomas de podridão fúngica)
Fonte: Embrapa