Tarifaço dos EUA: O que afeta no agro brasileiro?

Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) divulgou uma análise das medidas tarifárias anunciadas na quarta (2) pelo presidente dos Estados Unidos ( EUA ), Donald Trump, e os impactos para o agro brasileiro. Confira a nota na íntregra:
O governo americano anunciou, por meio de ordem executiva do presidente Donald J. Trump, a aplicação de tarifas de importação adicionais para bens exportados do mundo aos EUA. A tarifa base anunciada para o Brasil é de 10%.
Trump anuncia taxa de 10% para produtos brasileiros
O novo pacote é, até então, o mais abrangente e tem sido encarado com muita cautela pelos entes públicos e privados, devido ao alto potencial de impacto no comércio internacional.
Comércio Brasil-EUA
Os EUA atualmente figuram como terceiro principal destino dos produtos do agronegócio brasileiro, atrás apenas de China e União Europeia, e em 2024 respondeu por 7,4% da pauta brasileira no setor, atingindo a marca de US$ 12,1 bilhões.
Ao longo dos últimos dez anos, a participação dos EUA na pauta exportadora do agronegócio brasileiro sempre figurou entre 6% e 7,5%. Isso evidencia um mercado consolidado para os produtos brasileiros, que apresenta relativa previsibilidade do ponto de vista geral. Os produtos agropecuários respondem por cerca de 30% do total das exportações brasileiras aos EUA.
Para alguns setores, o mercado americano é de grande importância. É o caso do café verde – principal produto do agro brasileiro destinado aos EUA – cuja participação dos EUA foi de 17% em valor no ano de 2024, e dos sucos de laranja, que atingiu 31%.
A elevação das alíquotas de importação sobre estes produtos pode minar a competitividade do Brasil neste mercado, impactando os rendimentos do produtor. No caso dos sucos de laranja, os EUA contam com alguma produção no mercado doméstico, que seria muito favorecida em relação à alternativa brasileira.
Com base na lista dos produtos mais relevantes da pauta exportadora, que correspondem a 85% do total de produtos do agronegócio vendidos aos EUA, foi avaliado o grau de exposição de cada produto à economia americana, de modo a melhor compreender a capacidade de redirecionamento destes produtos a outros mercados.
Produtos com classificação crítica são aqueles em que o desvio é praticamente impossível dado o alto grau de dependência do mercado americano, enquanto aqueles classificados como de alta exposição encontrarão dificuldades para a absorção por outros mercados.
Já os de exposição leve e moderada podem encontrar algumas oportunidades em outros mercados, mas ainda sentindo os impactos do tarifaço nos EUA.
Tarifas Anunciadas e Impactos ao Setor
A ordem executiva, publicada no dia 02/04 pela Casa Branca, definiu os produtos a serem sobretaxados e as alíquotas incidentes sobre cada país. No caso do Brasil, os bens importados contarão com uma alíquota adicional de 10%, salvo exceções para uma minoria de produtos como os artigos de madeira.
As alíquotas a serem aplicadas ao Brasil ficaram no patamar base para todos os países, enquanto mercados como a China contarão com alíquotas de 34%, somadas aos 20% impostos em medidas anteriores.
Antes do anúncio da medida, os produtos do agronegócio brasileiro contavam com alíquotas nominais médias de 3,9% do valor do produto. Com o acréscimo linear, estas taxas passarão à 13,9%, afetando a competitividade de artigos brasileiros. Apesar do acréscimo, o Brasil estará em uma posição melhor, se comparado aos casos em que os EUA importam produtos de mercados que contarão com taxas maiores, como é o caso dos bens da União Europeia que receberão sobretaxas de 20%.
Os produtos mais afetados serão os que o Brasil já é altamente representativo no total das importações dos EUA, isso porque, nestes casos, o Brasil não teria “espaço” paraganhar de um eventual concorrente, sendo o único ou principal país afetado. É o caso dos sucos de laranja resfriados e congelados, onde o Brasil responde por 90% e 51% das
compras americanas, respectivamente; da carne bovina termo processada, com 63%; e do etanol, com 75%.
Ainda há potencial de perda de mercado com relação a produtos produzidos pelos EUA e fornecidos internamente, mas que necessitam de complementação por meio de importações. É o caso da carne bovina, na qual a produção local alcança 12,3 milhões de toneladas, mas o consumo atinge 13 milhões de toneladas, e do óleo de soja, entre outros produtos, nos quais o consumo fica próximo da produção.
A CNA realizou uma avaliação preliminar acerca do eventual impacto sobre os produtos do agronegócio brasileiro com base nas sensibilidades das importações americanas, em relação às variações referentes aos preços dos bens importados no país utilizando dados históricos.
A sensibilidade foi estimada usando as elasticidades e a variação nos preços dos bens importados foi considerada equivalente à alíquota adicional aplicada pelos americanos.
Desta forma, buscou-se estimar as variações quantitativas na demanda americana por produtos brasileiros dada a variação positiva de 10% nos preços. O resultado mostra que os principais produtos impactados seriam justamente aqueles em que o Brasil é dominante no mercado dos EUA, como por exemplo os sucos de laranja e outras frutas, o etanol e o açúcar –que concorrem em parte com a produção interna dos EUA.
Apesar disso, o método não considera a possibilidade de desvios de comércio gerados por ganhos de competitividade nos casos em que os concorrentes brasileiros enfrentem maiores tarifas. Logo, os resultados refletem um cenário em que as perdas e ganhos seriam assumidas e em que todo o contexto permanecesse constante.
Considerações Finais
Ainda é precipitado avaliar eventuais perdas ou ganhos para o Brasil com o anúncio das tarifas recíprocas pelos EUA, visto que a alteração tarifária afeta todos os países do mundo, inclusive grandes exportadores de produtos agropecuários.
Cabe destacar que novas tarifas podem ser impostas, caso o governo dos EUA considere que as medidas anunciadas não sejam eficazes na resolução do déficit comercial geral.
Como a ordem executiva cita que a eventual redução de medidas significativas para corrigir arranjos comerciais não recíprocos poderá diminuir ou limitar o escopo das tarifas impostas, cabe ao governo brasileiro seguir explorando a via negociadora com os EUA para buscar mitigar as tarifas anunciadas e alcançar benefícios mútuos para ambas as
nações.
Instrumentos de proteção para medidas retaliatórias e barreiras unilaterais, como o que será alcançado por meio do PL nº 2088/2023 (PL da Reciprocidade), aprovado pelo Congresso e que seguirá para sanção presidencial, devem ser utilizados apenas após o esgotamento dos canais diplomáticos, para defender os interesses brasileiros.
A Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA) defende o livre comercio por meio de acordos que diversifiquem mercados, aumentem a renda dos produtores e ampliem o
acesso de produtos agropecuários ao consumidor.