Estudo feito em reserva biológica mostra relação de biomassa acima do solo com biodiversidade
Um estudo abrangente realizado na reserva biológica Mogi Guaçu, localizada naquela cidade, em São Paulo, revelou uma relação significativa entre a quantidade de biomassa acima do solo e a biodiversidade no bioma do Cerrado. Essa é a primeira vez que essa relação de dependência é apresentada ressaltando a importância do bioma Cerrado e de sua biodiversidade no sequestro de carbono.
Os resultados encontrados, fruto do mestrado de Ana Paula de Oliveira Risante, mostram que os valores de biomassa obtidos nessa pesquisa estão dentre os mais altos registrados para esse tipo de vegetação, e que essa região em particular se destaca como uma das áreas com os maiores níveis de biomassa. A descoberta é particularmente relevante, uma vez que existem poucas informações disponíveis sobre a biomassa do Cerrado no Estado de São Paulo, o que contribui com os cálculos das emissões e sequestro de carbono pela vegetação ao longo do tempo.
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A área de estudo, uma região de Cerrado, abriga impressionantes 67 espécies de árvores, com uma densidade de aproximadamente 1.596 árvores por hectare. Esses números representam um marco crucial para a preservação da região e para a manutenção de sua rica biodiversidade. O estudo avaliou não apenas a biodiversidade, mas também a quantidade de biomassa acima do solo, a quantidade de biomassa nas raízes das árvores e os estoques de carbono.
Os resultados apontam que a quantidade de biomassa acima do solo na região é de aproximadamente 77 toneladas por hectare. Além disso, foram encontradas 8,5 toneladas de carbono armazenadas no solo e 1,64 toneladas de carbono por hectare nas raízes das árvores a uma profundidade de até 30 cm. Vale destacar que, de acordo com registros históricos da reserva, até o ano de 1964, essa área era utilizada como pasto para gado de corte.
O Cerrado é um dos principais biomas do Brasil ocupando uma área de aproximadamente 25% do território nacional. A vegetação do cerrado é predominante no Brasil Central, estende-se desde São Paulo, abrangendo toda a região central e chegando ao Norte, em estados como Rondônia e Roraima, em locais isolados. Apesar de abrigar uma fauna e flora únicas e ser considerado um hotspot mundial de biodiversidade, apenas 8,2% de sua área está protegida em unidades de conservação, tornando sua preservação ainda mais crucial.
Para Paula Packer, chefe-geral da Embrapa Meio Ambiente, a determinação dos estoques de biomassa na vegetação fornece informações fundamentais para compreender os processos de transferência de carbono em diferentes partes da natureza. Este estudo enfatiza a importância da preservação do Cerrado, destacando a relevância de sua flora específica e sua produtividade. A suspensão das atividades humanas e a redução da incidência de incêndios podem levar a um aumento na densidade da vegetação e na biomassa das espécies arbóreas.
Além disso, o sistema radicular bem desenvolvido das árvores e arbustos do Cerrado, capaz de alcançar grandes profundidades, desempenha um papel crucial na superação dos desafios relacionados à escassez de água. A relação entre biomassa das raízes e o carbono do solo também foi estabelecida neste estudo, representando uma descoberta inédita. Isso permite estimar a quantidade de carbono nas raízes por meio de análises de solo, demonstrando uma relação direta entre a presença de raízes e o armazenamento de carbono no solo.
O Cerrado de São Paulo recebeu pouca atenção em pesquisas devido ao rápido desmatamento que ocorreu na região nos últimos 100 anos, resultando em apenas cerca de 25% de área de vegetação nativa remanescente.
Esse bioma é caracterizado por sua estação seca bem definida, solos profundos e bem drenados que podem apresentar alta acidez e elementos em concentrações tóxicas. A presença de árvores e arbustos tortuosos de menores dimensões distribuídas na área de maneira esparsa faz com haja a presença de um estrato graminoso característico. As gramíneas, associadas a locais com estações bem definidas como esse, fazem com que haja a ocorrência esporádica de incêndios e o desenvolvimento de uma vegetação característica e bem adaptada a isso.
A preservação do Cerrado é fundamental devido a sua rica biodiversidade e às relações intrincadas que mantém com outras formas de vida, fornecimento de abrigo e serviços ecossistêmicos incluídos. Embora sejam análises realizadas por imagens, os dados obtidos no campo são escassos, tornando os estudos como estes essenciais para embasar cálculos de emissões e sequestros de carbono. O Cerrado é uma das paisagens mais notáveis e diversas do Brasil, e sua conservação desempenha um papel crucial na mitigação das mudanças climáticas e na manutenção da biodiversidade.
O pesquisador da Esalq Ciro Abbud Righi destaca a importância da biodiversidade na criação de habitats para espécies que habitam o Cerrado, contribuindo para a capacidade do bioma em realizar fotossíntese e armazenar carbono. A pesquisa enfatiza a relação direta entre biomassa e biodiversidade no Cerrado, apontando que, após um certo limite, os estoques de carbono tendem a se estabilizar. Isso tem implicações significativas para a compreensão das emissões de gases relacionadas às mudanças no uso da terra. “O estudo mostrou que quanto mais biodiversidade, mais biomassa, mas depois de um determinado valor, esse padrão não tem mais efeito”, explicou Righi.
Em um contexto global, o desmatamento tropical contribui com cerca de 15 a 25% das emissões globais de dióxido de carbomo, com o Brasil desempenhando um papel fundamental nesse cenário, sendo responsável por mais de 70% das emissões de carbono resultantes do desmatamento e das mudanças no uso da terra.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), estima-se que o Cerrado ocupe mais de 24% da área total do Brasil, abrangendo cerca de 203 milhões de hectares. Dada a idade avançada e alta porosidade de seus solos, o bioma é uma fonte crucial de recursos hídricos, abrigando córregos que alimentam muitas das principais bacias hidrográficas do país. Com mais de 12.000 espécies diferentes de plantas, muitas delas endêmicas, o Cerrado se destaca como a savana mais biodiversa do mundo.
Sendo a produção de soja uma atividade predominantemente na região, com grande parte dos grãos destinada ao mercado internacional, o intenso uso da terra acelerou o processo de degradação das condições químicas, físicas e biológicas dos solos.
“A preservação do cerrado e das demais vegetações é assim essencial para a manutenção dos processos ecológicos e assim da vida no planeta. Essa pesquisa contou com o apoio inabalável do professor Hilton Thadeu Zarate do Couto, um dos maiores pesquisadores da área florestal desse país e que nos deixou em seu apogeu recentemente. Certamente, seu legado de ensinamentos e pesquisas e sua característica perseverança e sorriso fácil marcaram positivamente milhares de pessoas em prol da vida”, destaca Righi.
Com Embrapa