Sistema de plantio de grãos conserva o solo

Fernanda Toigo

Fernanda Toigo

SPDG, difundido pela Epagri há 40 anos, é umas das tecnologias do Plano Estadual ABC+ (Foto: Jonatan Jumes / Epagri)

Por que se fala em mitigar a emissão de carbono? Porque, para efeito de cálculo, os três gases causadores do efeito estufa são transformados em carbono, o que se chama carbono equivalente (CO2eq). É disso que trata o Plano Estadual ABC+ 2020-2030, que se refere à agricultura de baixa emissão de carbono.

O Plano Estadual ABC+ é formado pela Epagri e outras instituições, que atuam para que famílias agricultoras e pescadoras produzam alimentos de forma rentável e com baixo impacto ambiental. Uma dessas práticas é o Sistema Plantio Direto de Grãos (SPDG).

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O sistema vem sendo difundido há mais de 40 anos em Santa Catarina. Nos últimos três anos a área foi ampliada em, pelo menos, 57.113 hectares no Estado. “Essa é a área onde o SPDG está sendo praticado corretamente, seguindo todas as orientações técnicas”, destaca Humberto Bicca Neto, extensionista rural e coordenador do Plano ABC+ na Epagri. Ele relata que, desde 2022, quando a segunda etapa do Plano teve início no Estado, a Epagri já capacitou mais de 2 mil agricultores catarinenses, que receberam as informações necessárias para adotar o SPDG de forma adequada.

Leandro Wildner, pesquisador do Centro de Pesquisa para Agricultura Familiar (Epagri/Cepaf), calcula que mais de 80% das famílias agricultoras que produzem grãos na região de Chapecó adotam o sistema. Ele reforça que o SPDG tem três princípios básicos: proteger o solo durante o ano todo com plantas de cobertura, estejam elas vivas ou mortas, quando formam a palhada; o não preparo do solo, com revolvimento apenas na linha de semeadura; manutenção da diversidade de animais e plantas, através da sucessão, consorciação e rotação de culturas.

Plantas que protegem o solo

Plantas de cobertura são vegetais específicos, que se destinam, entre outros fins, a proteger o solo contra a erosão e melhorar suas qualidades químicas, físicas e biológicas. Elas protegem e enriquecem o solo estando vivas, ou mesmo mortas.

Lavoura de soja e milho com palhada protegendo o solo (Fotos: Aires Mariga / Epagri)

Mas como isso acontece? Lembra lá do começo desse texto, onde afirmamos que toda forma de vida conta com carbono em sua constituição? Então é fácil concluir que plantas também contém carbono, que é o principal componente da matéria orgânica que dá vida ao solo. Explicando de forma bem simples: as plantas captam carbono da atmosfera para, através da fotossíntese, produzir massa vegetal, que é formada por raízes, talos, folhas, frutos e sementes. Durante a primeira etapa do ciclo vegetativo, as plantas crescem e acumulam massa vegetal e nutrientes; na segunda etapa do ciclo, a partir da floração, as plantas passam para o período reprodutivo, com foco na produção de frutos e grãos. A partir do manejo da massa vegetal, para formação da cobertura do solo, ou da colheita, que deixa a palha sobre a terra, começa uma lenta decomposição.

Está aí um dos segredos do SPDG no combate à emissão de gases do efeito estufa. Como o sistema preconiza o não revolvimento do solo que vai ser cultivado, esse carbono não volta imediatamente à atmosfera, ou seja, ele fica armazenado ali na palha que permanece sobre a superfície do terreno ou nas raízes, dentro do solo, compondo a matéria orgânica que vai sendo lentamente decomposta pelos organismos. Esta etapa de parcial indisponibilidade de carbono e sua decomposição é chamada de sequestro de carbono, ou seja, de baixa emissão de carbono para a atmosfera.

Menos fertilizantes, mais rentabilidade

“Quanto mais matéria orgânica eu tenho no meu solo, melhor é a sua capacidade produtiva”, pondera Júlio César Ramos, pesquisador da Epagri/Cepaf. Isso pode diminuir consideravelmente – ou até eliminar – a necessidade de fertilizantes para se alcançar uma boa produção.

Os fertilizantes à base de nitrogênio estimulam os microrganismos do solo a produzirem óxido nitroso, um dos gases do efeito estufa. Júlio acrescenta que grande parte do nitrogênio que é aplicado acaba volatilizando na forma de amônia (NH3), chegando à atmosfera. Lá, a amônia pode ser oxidada e formar mais óxido nitroso, além de formar outros poluentes atmosféricos. Há também o gás carbônico eliminado no transporte dos fertilizantes. Fácil perceber como o SPDG contribui de várias formas para a mitigação do efeito estufa.

E não param por aí os benefícios do SPDG. De acordo com Humberto, o plantio direto de grãos promove maior disponibilidade de água, já que torna o ambiente favorável ao crescimento das raízes das culturas, o que aumenta a eficiência no uso desse recurso. Diminui as perdas de produtividade e a vulnerabilidade dos grãos às pragas. Contribui ainda para reduzir os impactos negativos de eventos de chuva extrema, pois evita erosão e dificulta a evaporação em períodos de escassez hídrica.

Família alcança produtividade acima da média 

Alessandro Valentini é testemunha das vantagens do SPDG. Ele e o irmão Alex tocam a propriedade da família, em Chapecó. Em janeiro deste ano fizeram a colheita do milho, alcançando uma produtividade que variou entre 10 e 12 toneladas por hectare. Isso fica acima da média estimada pela Epagri/Cepa para safra estadual 2024/25 do grão, que é de 8,6 toneladas por hectare. A palha do milho colhido permaneceu no solo, servindo de base e cobertura para o plantio da soja safrinha, que iniciou imediatamente após a colheita.

Alessandro herdou do pai, Arlindo Valentini, a prática de produzir grãos em sistema de plantio direto, e não se arrepende. O agricultor afirma que, além de alcançar mais produtividade, consegue conservar melhor o solo e evitar erosão. A rentabilidade é impulsionada pela redução do uso de insumos, o que ele afirma ser uma das principais vantagens. E, em tempos de estiagens, frequentes na região onde produz, sua lavoura “aguenta mais tempo”, segundo suas palavras.

Economia que o agricultor não percebe

Leandro Wildner, pesquisador da Epagri/Cepaf, relata que o ato de não preparar o solo antes da semeadura traz uma vantagem econômica que muitos agricultores não percebem. Cálculos da Epagri/Cepaf para a safra 2023/24 mostram que a retirada do preparo do solo, caracterizado por uma lavração mais duas gradagens, resulta na diminuição de um custo médio de R$970,00 por hectare para o agricultor. No caso das propriedades que optam pelo SPDG, esse investimento se torna desnecessário. “Isso é uma economia que o agricultor, muitas vezes, não leva em consideração”, alerta.

O pesquisador conta que existem lavouras no Oeste catarinense que praticam o SPDG há 30, 35, e até 40 anos, nas quais nunca mais houve revolvimento ou preparo do solo. Há também casos de propriedades que após 10 ou 20 anos da adoção do sistema, precisaram revolver e preparar o terreno a ser cultivado. De acordo com Leandro, esta variação de tempo está ligada ao tipo de solo e ao manejo praticado por cada agricultor.

Seu Arlindo, pai do Alessandro, adotou o SPDG há cerca de 30 anos, sempre com orientação e apoio da Epagri. Ele conta com orgulho que, neste período, várias áreas da propriedade de 250 hectares nunca foram revolvidas ou preparadas, e permanecem produzindo grandes volumes de grãos, se valendo apenas do poder do plantio direto.

Para quem pretende iniciar no SPDG, o experiente agricultor deixa um conselho: “tem que seguir, né?” A simplicidade da colocação reflete a confiança e a serenidade de quem sabe que, há três décadas, opta pelo sistema mais sustentável e rentável para produzir grãos em Santa Catarina.

(Com Gisele Dias/Epagri)

 

Autor: Fernanda Toigo

Fernanda Toigo

Fernanda Toigo. Jornalista desde 2003, formada pela Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas de Cascavel. Iniciou sua carreira em veículos de comunicação impressos. Atuou na Assessoria de Comunicação para empresas e eventos, além de ter sido professora de Jornalismo Especializado na Fasul, em Toledo-PR. Em 2010 iniciou carreira no telejornalismo, e segue em atuação. Desde 2023 integra a equipe de Jornalismo do Portal Sou Agro. Possui forte relação com o Jornalismo especializado, com ênfase no setor do Agronegócio.

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