Estudo identifica crescimento da agricultura orgânica graças à dedicação dos produtores

Tatiane Bertolino
Tatiane Bertolino

Um estudo identificou crescimento da agricultura orgânica graças à dedicação dos produtores. A Dinamarca criou um ambiente institucional favorável para ampliação da dinâmica produtiva da agricultura orgânica por meio de um círculo virtuoso de interação entre os setores público e privado. Um estudo conduzido pela Unicamp e Embrapa Meio Ambiente verificou uma grande evolução agrícola que alcançou, no século XXI, lugar de destaque na produção e consumo destes produtos. Essa evolução ocorreu devido a organização e cooperativização dos produtores rurais familiares em “comunidades parceladas”, por meio da implementação de marcos regulatórios aprovados no parlamento e pela busca crescente da produtividade agrícola, uma vez que a partir da década de 1970, devido à crescente pressão ambiental de órgãos internacionais como ONU e IFOAM, os movimentos ambientalistas e de agricultura alternativa, incluindo os agricultores orgânicos, ganharam força.

A criação da Associação Nacional de Agricultura Orgânica em 1981 e da Escola Nacional de Agricultura Orgânica (DØJ) em 1982 buscou a capacitação dos agricultores orgânicos filiados e a fundação de um núcleo de estudos sobre agricultura orgânica pela Universidade Agrícola em 1987, são ações que demonstram o compromisso com o ensino, pesquisa e extensão rural, explica Lucas Lima, doutorando da Unicamp.

Outro marco importante, continua Lima, foi a aprovação da Lei da Agricultura Orgânica em 1987, onde foram institucionalizadas as regras para garantia da qualidade dos produtos e a criação do rótulo orgânico. “Portanto, a implementação de ações focadas na conversão de terras, preparação do solo, compra de equipamentos e insumos naturais, desenvolvimento de novas espécies e controles naturais de pragas, financiamento de instituições de ensino agrícola para treinamento e capacitação dos agricultores locais, criação de programas de compras públicas de alimentos orgânicos para cantinas, escolas e hospitais públicos; ações de publicidade e marketing em torno dos benefícios do consumo de alimentos orgânicos para a saúde e bem estar da população; destinação de aproximadamente € 1,5 bilhões para crédito aos produtores orgânicos, geraram esses bons resultados”, acredita Lima.

Essas políticas contribuem para a mitigação de problemas ambientais, melhoria de indicadores de alimentação e saúde e geração de renda para os produtores rurais. O processo de desenvolvimento rural experimentado por esse país gerou, de um lado, a ampliação da oferta e, de outro, o aumento da demanda, tornando os dinamarqueses os líderes mundiais no consumo de produtos orgânicos.

Para a mitigação das crises ambientais globais estão sendo propostas políticas de promoção de sistemas de produção e consumo sustentáveis e ecologicamente responsáveis. Um exemplo concreto é a política de combate à fome e estímulo à agricultura sustentável, presente nos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) propostos pela ONU na Agenda 2030. De acordo com a pesquisadora Lucimar Abreu, da Embrapa Meio Ambiente, a produção orgânica contribui para a aplicação das ações dos ODS, mitigando problemas como a fome, as questões de saúde e ambientais e é o tema central de investigação deste trabalho. As áreas disponíveis para cultivo de orgânicos e as vendas desses produtos no varejo apresentaram crescimento constante para os 186 países pesquisados.

Agricultura modelo

País nórdico membro da União Europeia, a Dinamarca é formada por uma península e mais de 400 pequenas ilhas, com uma área de 43.100 km2, equivalente ao estado brasileiro do Rio de Janeiro, possui aproximadamente 5,6 milhões de habitantes, densamente povoado, com aproximadamente 130 habitantes por km2. Dispõe de 256.711hectares para a produção orgânica, entretanto, possui o maior marketshare do mundo com 11,5% do mercado global, movimentando cerca de 1,8 bilhões de euros. Além disso, os dinamarqueses, juntamente com os suíços, tiveram o maior consumo anual per capita de produtos orgânicos, no valor de 312 euros. Em termos percentuais, aproximadamente 12% das compras de alimentos dos dinamarqueses foram em produtos orgânicos, que é a maior participação de mercado orgânico em comparação com qualquer outro país do mundo.

O Grupo de Estudos Agrícolas, formado no final da década de 1970, tem estudantes de agricultura, jovens agricultores, pessoas envolvidas em grupos alternativos de moradia (movimento cooperativo), acadêmicos, pesquisadores de tecnologias e modos de vida alternativos, e ativistas políticos. Nos anos 1980, os consumidores puderam escolher alimentos orgânicos com o logotipo da Associação Nacional de Agricultura Orgânica, que também registrou a marca Økologisk (Ecológica), de modo que os agricultores que desejavam vender alimentos orgânicos tiveram que se juntar a ela e a seu sistema de inspeção. Em 1982, outro marco importante foi alcançado quando a Escola Nacional de Agricultura Orgânica foi estabelecida e pôde oferecer cursos in loco. A partir de 1987, foi institucionalizado um sistema de certificação governamental.

Em julho de 1993, os maiores supermercados dinamarqueses introduziram alimentos orgânicos a preços promocionais, isto é, reduziram os preços de 40 produtos entre 15% e 20%. Essa estratégia gerou resultados imediatos, com o aumento das vendas, especialmente de leite e hortaliças. A concessão de descontos também induziu supermercados menores a seguir essa linha e ainda estimulou as redes de supermercados, que até então evitavam comercializar alimentos orgânicos, a fazê-lo.

Um plano de ação para a agricultura orgânica foi lançado em fevereiro de 1999 e uma das propostas foi a de que a área com agricultura orgânica deveria aumentar para 10% da área agrícola total. A taxa de crescimento de cultivo com agricultura orgânica em relação à área agriculturável total da Dinamarca atingiu seu ápice em 2018, representando 9,8% do total agriculturável, sendo que a média dos países da União Europeia, no mesmo período, foi de 7,7%. Segundo dados da IFOAM (2020), o consumo per capita anual de produtos orgânicos na Dinamarca foi de 312 euros, o que representa o maior do mundo ao lado da Suíça.

O governo realizou a conversão da produção convencional para orgânica em terras de propriedade pública e ampliou os esforços junto às cozinhas públicas no sentido de apoiar sua transformação. Com aproximadamente meio milhão de refeições produzidas por dia, o governo considerou as compras públicas o principal fator para aumentar a demanda e, portanto, aumentar a área de produção. Além disso, também o montante de alimentos orgânicos comercializados nas lojas de varejo apresentou crescimento expressivo entre 2003 e 2009, retomando de uma forma com ainda mais destaque a partir de 2014, atingindo em 2018 um volume comercializado quase três vezes maior ao do ano de 2003.

O trabalho completo na página 237 do VI Colóquio de Agricultura, Alimentação e Desenvolvimento, em Porto Alegre, RS, é de Lucas Lima, Unicamp, Lucimar de Abreu, Embrapa Meio Ambiente e Ademar Ribeiro Romeiro, Unicamp.

Com Embrapa

(Tatiane Bertolino/Sou Agro)

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