Estiagem: ações que o produtor deve adotar para amenizar os impactos nas lavouras
A falta de chuva impactou duramente as lavouras e a safra de grãos 2023/24, de acordo com a última estimativa divulgada pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a quebra da produção, em relação a estimativa inicial, chega a 17,7 milhões de toneladas.
Diante deste cenário, e perdas semelhantes já ocorridas em safras anteriores, também por conta dos efeitos climáticos, o produtor tem procurado alternativas que possam ajudar a amenizar os efeitos que a falta de chuva causa na planta, independente da fase em que ela se encontra.
Especialistas e pesquisadores têm ajudado na busca por soluções e orientam sobre ações que podem ser adotadas a curto, médio e longo prazo para que as lavouras fiquem menos suscetíveis às condições climáticas. Uma delas é a definição da cultura de acordo com o período em que a semeadura será realizada. “Na hora de escolher a cultura observar se tem uma janela adequada para o plantio. A cultura tem que ser instalada na data correta para conseguir garantir a produtividade. Então a orientação é que o produtor evite as datas de risco, respeitando a cultura que você está plantando. A não ser que você tenha sistema de irrigação que permite você fugir dessas datas, o que em 98% dos casos não existe para as grandes culturas, então seguir as datas de plantio de cada cultura vai te ajudar a fugir de uma possível perda” alerta o gerente regional de marketing da FMC, Rômulo Bortoluzzi.
Romulo ressalta ainda que ainda antes da implementação da cultura é preciso garantir que haja uma boa cobertura de solo. “Manter um solo bastante coberto com uma alta quantidade de matéria orgânica ajuda a reter água no solo. Quando você deixa o solo exposto você tem um problema, então têm tido mais sucesso os produtores que tem feito uma boa rotação de cultura e tem mantido uma boa cobertura do solo, esse é um manejo que muda o status das lavouras em climas adversos. Além disso, a utilização de produtos biopotencializadores para manter a planta ativa, porque quando o clima se altera e a planta tenta parar e se proteger, fazem com que a planta já esteja estimulada e possa se proteger antes do efeito do clima prejudicar seu desenvolvimento” completa.
Manejo do solo x infiltração da água
O cuidado com o solo é analisado de forma mais profunda por meio das pesquisas da Embrapa Soja. Aumentar a capacidade de absorção e retenção de água é o principal meio de evitar que as plantas sofram os impactos das condições climáticas adversas. “Precisamos agir para aumentar a reserva hídrica o solo, para que possamos enfrentar com mais tranquilidade esses períodos de cenários extremos, e isso tanto quando chuva não chega em volumes necessários, quanto quando ela vem em volumes acima do esperado, se o solo é mal manejado, por exemplo, essa água em vez de entrar totalmente no solo ela escorre, causa erosão e vai parar nos rios, causando enchentes e com isso o lençol freático não foi abastecido e não faz reserva de umidade”, explica o pesquisador da Embrapa Soja, Marco Antônio Nogueira.
Uma das formas que o produtor pode buscar evitar ficar suscetível à insegurança que as condições do clima trazem é voltar os cuidados para a restauração do solo e suas lavouras. “Precisamos agir para aumentar de novamente a capacidade do solo de receber água, permitir que o solo faça seu perfil de regulador do ciclo hidrológico que é absorver a água num determinado momento quando chove e liberar aos poucos essa água para a planta se alimentar em um momento de escassez”, reforça.
Como recuperar o solo?
O manejo correto e recuperação do solo das lavouras é composto por uma série de fatores, detalhados pelo pesquisador. “Geralmente o sistema de produção soja/milho já está em uso há muito tempo, então temos baixos teores de matéria orgânica no solo, ele muitas vezes já está compactado, e aí a água consegue penetrar ali até 10/15 cm, muito difícil passar disso porque tem uma camada de impedimento. É muito importante a gente restaurar e recuperar a capacidade de infiltração de água no solo, e como a gente faz isso? Investindo em plantas com sistemas de raízes abundantes que vão também alimentar a comunidade biológica de micro-organismos ao seu redor. Essas plantas com raízes abundantes também ajudam a organizar o solo, colaborando para a criação de “caminhos” por onde a água passa e consegue se infiltrar na água” garante.
Uma das possibilidades para essa recuperação é a utilização de outra cultura, que tenha as raízes mais robustas em meio à cultura do milho ou mesmo sozinha no período entressafra. “Pesquisas mostram que com a dobradinha de soja e milho o solo tem capacidade de absorver só 30 litros de água por metro quadrado. À medida que vai se diversificando o sistema, que pode ser feito por meio da inclusão de uma braquiária consorciada com o milho ou de uma braquiária solteira, nós temos um ganho de capacidade de infiltração da água no solo por conta das raízes, com o tempo essa taxa que antes era de 30 litros agora chega a 100 litros de água por metro quadrado. O que aumenta e muito o armazenamento dessa água no solo”, enfatiza.
A cobertura do solo, técnica já conhecida do produtor, precisa caminhar junto com o novo manejo, a fim assegurar que a umidade permaneça no solo das lavouras. A manutenção da palhada ajuda a evitar a evaporação, fazendo com que essa água evapore por dentro da planta, que absorve ela, se desenvolve e depois joga para a atmosfera.
Sementes mais resistentes à estiagem
Outra frente de pesquisa, na busca de soluções para evitar impactos severos e prejuízos nas lavouras por conta da falta de chuva, é o melhoramento das sementes, em especial da soja. “O melhoramento genético tem trabalhado para desenvolver sojas com mais tolerância às condições climáticas adversas. Temos no mercado algumas variedades transgênicas com essa tecnologia. E uma nova fronteira do melhoramento genético que está começando é a edição gênica, que é a modificação direto no gene da planta sem precisar trazer gene de fora, como é feito na transgenia, em que você traz um gene de outra espécie”, anuncia o analista de transferência de tecnologia da Embrapa Soja, Rogério de Sá Borges.
Rogério aponta vantagens na edição gênica em relação a transgenia. “A edição gênica não é considerada transgenia, a ação é mais rápida também, já se pega uma planta que tem produtividade e se faz modificações que a deixem mais tolerante à seca. A planta editada, não transgênica, não tem todo aquele processo de avaliação e regulamentação que custa muito caro e leva muito tempo. É uma forma mais ágil de colocar no mercado uma planta com a tecnologia desejada. Então se ganha tempo, eficiência e chega mais rápido nos resultados que se busca. A maioria dos países tem se manifestado em relação às plantas editadas afirmando que não é considerada transgenia, isso facilita a exportação dessa cultura também”, esclarece.
Já existem variedades no mercado com essa edição, mas cultivares de soja ainda estão em desenvolvimento. “A edição gênica já é uma realidade, temos plantas editadas já lançadas no Brasil, porém soja ainda não. A Embrapa tem materiais de soja com essa edição, que nós estamos avaliando já em campo, e temos uma expectativa de lançamento para o mercado em 2 ou 3 anos, estamos avaliando em campo”, conclui.