PECUÁRIA
Pesquisadores falam sobre a preocupação com o volume de leite que o Brasil está importando
O Mercado Lácteo Brasileiro e o Mercado das Importações foi tema da apresentação da Embrapa Gado de Leite na Câmara Setorial da Cadeia de Leite e Derivados, realizada nessa semana, pelo pesquisador e economista Glauco Rodrigues Carvalho. Os dados disponibilizados para a cadeia produtiva suscitaram reflexões e debates durante mais de duas horas envolvendo um público de produtores rurais e representantes da indústria de laticínios, cooperativas, associações, CNA e do governo federal. Os participantes manifestaram preocupação com o volume de leite que o Brasil está importando, antes no patamar entre 3% a 5% do consumido no País, hoje em 10% deste total.
A apresentação foi dividida em duas partes: um momento reservado a informações sobre a balança comercial, precificação e conjuntura e o segundo sobre os desafios para a produção do leite no Brasil. A situação histórica do leite brasileiro se difere das diversas cadeias do agronegócio, como soja, milho, boi e frango, por exemplo. Embora o Brasil figure como o quarto maior produtor mundial de leite, o País convive com um déficit estrutural na balança comercial. No ano passado, o setor fechou com um saldo negativo de quase meio bilhão de dólares na balança de lácteos.
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“Quando olhamos o comportamento da importação brasileira de leite, observamos que é mais forte no final do segundo trimestre, se consolidando ainda mais no terceiro trimestre, que é justamente quando começamos a sair da entressafra e a produção de Argentina e Uruguai está mais alta. Este ano, no entanto, aconteceu diferente. Abrimos o ano com um volume mais forte, importamos um quantitativo de 800 milhões de litros de leite-equivalente de janeiro até maio. Estamos importando algo próximo de 10% da produção mensal. Historicamente, essa nossa importação ficava na casa de 3% a 5%. Este ano, de fato, estamos com um volume atípico e uma alta mais forte em um período que isso não acontece que é o primeiro semestre”, explicou Carvalho durante sua apresentação aos representantes da cadeia.
Produção e importação
Ele ponderou que ao se observar a produção interna e a importação, a disponibilidade per capita vem crescendo cerca de 5%, considerando a balança comercial, o que se reflete no preço. “O preço é um reflexo da oferta e da demanda, quanto maior a oferta, menor o preço”, detalhou. Para ele, embora o momento seja de entressafra do leite, os preços, este ano, diferentemente dos anos anteriores, já estão recuando, devido às importações mais fortes e um consumo ainda fraco.
“O que observamos é um processo de declínio dos preços no mercado atacadista em um momento que, no geral, isso não acontece, a mesma coisa ocorrendo em relação ao preço junto ao produtor”, observou o pesquisador. No entanto, apesar do recuo dos preços internos do leite (leite em pó, UHT, muçarela), Carvalho observou que, este ano, o declínio do preço do leite está acontecendo mais cedo. “Apesar deste recuo, estamos vendo preços de insumos melhores do que vimos no ano passado, reduzindo o custo de produção”, complementou.
Margem ao produtor
Ao comparar a diferença entre o preço do derivado lácteo no atacado e o preço pago ao produtor rural (o chamado spread), observou-se que, apesar das importações, essa margem está melhor do que no ano passado, no caso do leite UHT. No queijo muçarela, o ano começou bem mais complicado para os laticínios, mas obteve uma recuperação das margens no mês de maio. O mercado de leite em pó também registrou pequena recuperação, apesar de ser um dos lácteos que sentem mais o impacto da importação, junto com a muçarela.
No entanto, uma das preocupações externadas pelo economista da Embrapa é que se o País mantiver o mesmo volume de importação do começo do ano, ou seja, da ordem de 10%, ao entrar o período da safra, quando a produção brasileira fica a cada mês que passa maior que o mês anterior, os preços tendem a registrar quedas mais acentuadas ao produtor rural.
Competitividade
Existem três grandes pilares que o Brasil precisa avançar na cadeia do leite para melhorar a competitividade: eficiência, estrutura produtiva e industrial, regulação e papel do governo federal. Um dos grandes problemas no Brasil é a baixa eficiência média.
A Argentina produz, em média, 7 mil litros de leite, por vaca, por ano. O Brasil, com exceção de duas microrregiões específicas – Ponta Grossa (PR), que engloba o município de Castro, capital nacional do leite, e Limeira (SP), que inclui o município de Araras, onde está a maior fazenda de leite do Brasil – todas as outras microrregiões ficam abaixo da média Argentina, com 2,7 mil litros, por vaca, ano. O mesmo acontecendo com o Uruguai, que produz, em média, 3.060 litros, por vaca. Além disso, as produtividades da mão de obra, da terra e do capital investido também são piores na média brasileira.
“A nossa média ainda é um desafio e isso contribui para a queda da nossa competitividade”, explica o pesquisador, lembrando, ainda, que o número de produtores, a densidade de leite por área e a qualidade é menor que nos dois países citados vizinhos. “Esse é um pouco do retrato que mostra os nossos desafios e onde podemos melhorar, como, por exemplo, a questão do número de produtores, a mão de obra, que são questões que precisamos caminhar um pouco mais”, explica.
Soma-se a este contexto a existência de uma competitividade vinda dos próprios sistemas de produção e outra vinda da taxa de câmbio, que acaba sendo um estímulo a mais para as empresas argentinas exportarem para o Brasil.
Por outro lado, dentre as vantagens competitivas do leite no Brasil, Carvalho apontou: (1) disponibilidade de terra (2) disponibilidade de água (3) clima favorável (4) disponibilidade de insumos/ração (5) salário, custo de mão de obra baixo (6) população elevada (7) consumo per capita com espaço para elevação (8) diversidade de sistemas de produção/flexibilidade.
Entre os desafios que a cadeia produtiva do leite precisa superar estão a falta de dados e informação organizadas sobre produção, o estoque e vendas, a baixa qualidade média do leite, a gestão deficiente das fazendas, a baixa produtividade de mão de obra, vacas, terra e capital. Além disso, a estrutura fragmentada da indústria e da produção leva a um alto custo do transporte e captação de leite. “Com relação às políticas públicas, é importante avançar na área de regulação, impostos e taxas, incentivos fiscais e infraestrutura”, disse o pesquisador da Embrapa.
Ao término da apresentação, a cadeia produtiva elogiou o trabalho detalhado desenvolvido pela Embrapa. “É importante pensarmos enquanto representants da Câmara Setorial e de formuladores de políticas públicas sobre como podemos melhorar o desempenho da cadeia produtiva do leite”, finalizou.
(Com EMBRAPA)