Baixas temperaturas exigem providências do pecuarista
Em meados de junho, um frio intenso e úmido assustou os pecuaristas de algumas regiões dos Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, principalmente do Pantanal, após uma junção de fatores que causou a mortandade de milhares de bovinos. Como o inverno ainda está no início, é possível que novas frentes frias batam à porta do produtor. Assim, a fim de evitar possíveis perdas, há medidas e conhecimentos que podem ajudar na tomada de decisão.
“Tem se observado com mais frequência, a ocorrência de condições climáticas adversas. É fundamental que os produtores estejam preparados para esses momentos. Tudo começa com um bom planejamento”, destaca a coordenadora do Programa de Boas Práticas Agropecuárias – bovinos de corte (BPA), Mariana Pereira, pesquisadora da Embrapa (Campo Grande-MS). Ela reforça que a condição sanitária e nutricional do rebanho igualmente é importante para evitar as mortes por hipotermia.
A médica-veterinária, Vanessa Felipe, complementa que “tanto os extremos de calor quanto de frio prejudicam o equilíbrio fisiológico dos animais, tendo como consequência o sofrimento e, muitas vezes, levando a condições incompatíveis com a vida”. A pesquisadora em sanidade animal observa que garantir condições que evitem desconforto físico e térmico é um dos cinco princípios básicos, ou liberdades, a serem atendidos em relação ao bem-estar animal, preconizados pela Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA).
Conhecer os fatores de risco que causam a hipotermia, que é a diminuição da temperatura corporal abaixo do normal estabelecido, causada pelo frio, geada, ventos ou chuvas, é de extremo valor. Diante desse cenário, soma-se a falta de abrigo para os animais e de alimentos. Soma-se também a condição corporal do indivíduo, a raça e a idade. Os pesquisadores afirmam que as ações preventivas devem ser tomadas em três níveis.
O primeiro é o enfrentamento à geada no campo. Luiz Orcirio, nutricionista da Empresa, começa pela proteção florestal, com áreas florestadas ou invernadas contendo “capões de mata”, que servem de agasalho aos animais contra os ventos gelados e as temperaturas a céu aberto. Para a proteção contra as correntes de ventos, recomenda posicionar os animais em invernadas que possuam barreiras naturais (morros) ou vegetais (árvores, reservas); e evitar correntes de ar frio, geralmente canalizadas, ao longo dos cursos d’água.
Uma prática simples, mas, às vezes, esquecida, é deixar os cantos de cerca abertos na direção por onde caminham os animais em busca de proteção e, claro, proteger os mais debilitados do rebanho, levando-os a uma área protegida próximo da sede da propriedade. Por fim, à medida do possível, manter a suplementação na dieta.
E depois da geada…
O planejamento para esse período de inverno começa nas outras estações. O ideal é evitar que os animais passem outono e inverno com escores corporais abaixo de quatro (escala de nove) ou três (escala de cinco). Em relação ao pasto, uma sobra de forragem para a fase de escassez, algo entre 4 e 5 ton de MS/ha para cada animal, para uma janela de cinco meses é recomendável.
Orcírio aconselha uma avaliação, por parte do produtor, da retirada dos animais da propriedade em tempo hábil, antes que percam muito peso. “Pode ser pela venda, parceria com outro produtor ou mesmo pela contratação temporária de um confinamento ‘boitel’ ”. Com o retorno das águas é primordial estimar os estragos causados, a fim de se planejar a necessidade de recuperação de pastagens e o ajuste do efetivo do rebanho, com relação à capacidade de suporte da fazenda.
Ações políticas
O terceiro nível se refere ao apoio financeiro e econômico de recuperação da atividade pecuária. Os especialistas sugerem que as entidades de classe – sindicatos, federação e associações de criadores – realizem estudos de impacto econômico, com o intuito de subsidiar possíveis reivindicações, como prorrogação de dívidas de custeio e investimentos, linhas de financiamento para recuperação de pastagens, manutenção ou recuperação de rebanhos, dentre outras.
“Incentivos ao reflorestamento com árvores nativas é uma alternativa também. A cobertura arbórea nativa é um patrimônio ambiental de enorme valor, pois mantém fixo o carbono retirado do ar em suas estruturas, recicla o carbono através das folhas, alimenta insetos e a fauna silvestre com flores e frutos. Além disso, proteger os animais do frio e do calor intenso, contribuindo para o bem-estar animal”, explica Orcirio.
Integrantes do BPA, Vanessa Felipe e Mariana Pereira ratificam que o bem-estar animal cada vez mais é uma pauta capaz de sensibilizar tanto a cadeia pecuária quanto a opinião pública. Ademais do caráter cíclico de eventos climáticos, que são capazes de trazer consequências negativas caso medidas de contenção não sejam tomadas. Assim, ao reunir esses dois temas, é visível a urgência de se “adiantar aos efeitos das mudanças climáticas para poder fornecer condições de alojamento e nutrição adequados para os bovinos de corte”.
(Com EMBRAPA)