AGRICULTURA
Trigo brasileiro é exemplo de qualidade
#souagro| A qualidade do trigo brasileiro é um exemplo de qualidade. Foi isso que a pesquisa conduzida pela Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ), Embrapa Trigo (RS) e Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio) atestou com o trigo cultivado no Cerrado Mineiro. Além do desempenho tecnológico, mostra bom rendimento no campo e na agroindústria, com características especiais que habilitam seu uso na panificação industrial, segundo a Instrução Normativa nº 38/2010, do Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).
A expectativa é que o resultado incentive ações de pesquisa e desenvolvimento para geração de novas cultivares adaptadas ao solo nacional e estimule políticas públicas de fomento à cadeia produtiva, reduzindo a dependência brasileira da importação do cereal.
- Fraude em benefícios pagos a pescadores é alvo de operação no Paraná
- Boi é resgatado de poço de seis metros em Foz do Iguaçu
Foram estudadas 34 amostras provenientes de 12 genótipos de trigo desenvolvidos pela Embrapa e cultivados sob sistemas irrigado e de sequeiro, em cinco municípios do Cerrado Mineiro. Os testes clássicos de caracterização físico-química e reológica (viscosidade) das amostras de trigo tropical mostraram qualidade tecnológica muito boa. As análises indicaram elevada força de glúten na maior parte delas, comprovando que o cereal é apropriado para ser utilizado na panificação ou mesmo em mescla com trigo de força menor, em caso de ser melhorador.
“Existe um enorme potencial comercial a ser explorado com o cultivo do trigo em ambientes tropicais, como o Cerrado Brasileiro”, afirma Martha Zavariz, pesquisadora de Laboratório de Qualidade de Grãos, da Embrapa Trigo. A região de Cerrado é caracterizada por não ter chuva na época de colheita, assim, os grãos são sadios com baixa atividade da enzima alfa-amilase, ou seja, não se apresentam germinados, sendo, portanto, adequados para produção de farinha para fazer pão. Além disso, os grãos, em geral, apresentam textura dura, gerando um bom rendimento em farinha, o que é muito interessante para os moinhos em termos comerciais. “Na moagem industrial, quando os grãos são duros, a casca ou farelo separa-se mais facilmente do endosperma (parte branca do interior do grão), permitindo rendimentos mais elevados em farinha branca”, explica.
- O que o suinocultor deve esperar de avanços para superar a crise?
- Diesel não é o único vilão do aumento no frete
Análises inéditas mostram também potencial prebiótico
Além dos estudos reológicos clássicos, a equipe de pesquisa realizou uma abrangente caracterização do amido, a partir de análises inéditas com o trigo do Cerrado. A equipe promoveu uma correlação estatística com 36 variáveis, que compreenderam desde aspectos ligados ao plantio até a transformação industrial do trigo em farinha para uso alimentício. “Identificamos um equilíbrio entre os teores do amido danificado e da força de glúten nas amostras analisadas, adequados para produção de pães de qualidade, com miolo macio, crosta crocante e visual atraente”, revela Cristina Takeiti, pesquisadora da Embrapa Agroindústria de Alimentos.
Especialmente as variedades cultivadas no município mineiro de Piumhí (MG) expressaram um alto nível de amido resistente, devido ao clima e ao solo da região. “Esse trigo apresenta uma estrutura molecular de amido mais cristalina, compacta e organizada, o que indica ser mais resistente à digestão, compatível, portanto, com potencial efeito prebiótico” aponta Mariana Larraz, professora e pesquisadora do curso de Pós-Graduação em Alimentos e Nutrição da Unirio. “Essa fração de amido resistente possui ação metabólica de fibra alimentar, trazendo benefícios para a microbiota intestinal e, consequentemente, para a saúde humana. Trata-se de um diferencial superinteressante do trigo cultivado no Cerrado Mineiro para o desenvolvimento de alimentos funcionais que contribuem para a promoção de uma alimentação mais saudável”, complementa a pesquisadora.
- Colheita de milho avança e produtividade é positiva no MS
- Casos de raiva continuam aumentando em Cascavel; cenário gera preocupação
Em síntese, os dados analisados pelos pesquisadores e publicados no artigo científico indicam que o Cerrado possui grande potencial para se tornar uma das maiores regiões produtoras de trigo de alta qualidade no mundo. Para alcançar esse patamar, segundo o professor e pesquisador do curso de Pós-Graduação em Alimentos e Nutrição da Unirio Luiz Carlos Gutkoski, que atua há mais de 30 anos em estudos de qualidade tecnológica de trigo, é preciso continuar investindo em pesquisa e desenvolvimento de novas cultivares de trigo adaptadas ao solo nacional e avançar em políticas públicas para incentivar a cadeia produtiva.
Por que o Brasil ainda importa trigo?
Com alta produtividade e qualidade de cultivo em várias regiões do país, como o Cerrado Mineiro, qualquer um pode se perguntar o motivo de o Brasil ainda importar trigo. A resposta para esta questão não é simples, e sua solução envolve a atuação de vários atores da cadeia produtiva.
A questão logística afeta negativamente a triticultura, devido aos altos preços do transporte terrestre em um país com dimensões continentais como o Brasil. “O excedente do trigo produzido no Rio Grande do Sul é exportado para outros países, e não abastece as regiões Norte e o Nordeste do país, por exemplo,”, explica Luiz Carlos Gutkoski, professor e pesquisador do curso de Pós-Graduação em Alimentos e Nutrição da Unirio.
- Cursos de capacitação garantem bons resultados nas propriedades
- Produtores de biodiesel podem solicitar o Selo Biocombustível Social
Uma das razões é que não há onde armazenar os grãos de trigo produzidos em excesso no Brasil. Segundo o professor, nos silos de armazenagem de grãos no Brasil, o carro-chefe é a soja, em segundo lugar, o milho, e o trigo vem apenas em terceiro lugar. Faltam políticas de compra pública e de armazenamento de grãos, que ainda é precário em um país tropical como Brasil. “O trigo brasileiro é de nível internacional, mas os produtores precisam de segurança para ampliar a área plantada e contar com a compra garantida pelo governo. É preciso investir em políticas públicas para este setor e para outras culturas de inverno, para ser mais rentável ao produtor investir nesta cultura”, afirma Gutkoski.
Para tentar superar esta dificuldade, no setor privado começa a ser observada uma estratégia comercial dos moinhos em subsidiar uma parte da produção nacional de trigo com garantia de compra após a colheita. Com a cevada, por exemplo, praticamente toda a produção é comprada pelas fábricas de cerveja nacionais.
(Débora Damasceno/Sou Agro com Embrapa)
(Foto: Embrapa)