PECUÁRIA
Falta frango no Reino Unido, e exportação brasileira pode crescer
O frango, carne preferida dos britânicos (metade de toda a carne consumida no Reino Unido), está em falta nas gôndolas e nas mesas do país. O sinal amarelo ficou visível no dia 12 de agosto, quando a rede americana KFC – em que impera a ave frita – avisou a seus consumidores que eles talvez se deparassem com “a falta de alguns itens do cardápio”.
Cinco dias depois veio o sinal vermelho: a rede de fast-food Nando´s precisou fechar temporariamente cerca de 50 de suas 450 lojas britânicas por causa da escassez de sua principal matéria prima.
“Uma espécie de pesadelo” que está afetando a cadeia de suprimentos do Reino Unido, disse a empresa também em rede social, prometendo fazer “todo o possível para devolver o peri-peri a seu legítimo lugar: seu prato”.
Peri-peri é o carro-chefe da rede de lanchonetes: um churrasco de frango marinado segundo receita portuguesa que, além da pimenta vermelha peri-peri, leva molho inglês, alho, cebola, limão, mostarda, pimenta do reino e sal. Mas, mesmo em outras versões, as aves em falta incomodam o consumidor britânico.
Parte do problema se deve à “pingdemia”, aumento súbito de pessoas alertadas, pelo aplicativo de saúde, de que deveriam se auto isolar durante dez dias por terem tido contato com um caso de Covid.
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Esse rigor sanitário afastou do trabalho motoristas e funcionários de frigoríficos, ao mesmo tempo em que a demanda cresceu, com a reabertura de restaurantes, bares e das atividades em geral.
Além do mercado de frangos, a “pingdemia” afetou várias indústrias alimentícias, chegando a esvaziar prateleiras de supermercados. Há algumas semanas, o governo pediu ao setor que relaxasse as regras dos afastamentos, o que deve aliviar esse gargalo.
Há porém uma trava de mais longa duração: as novas regras de imigração impostas pelo brexit. Em vigor desde 1º de janeiro de 2021, elas afetaram em cheio a mão de obra da indústria avícola, que emprega cerca de 40 mil trabalhadores, 22,8 mil (60%) dos quais são cidadãos europeus, segundo o British Poultry Council (BPC), associação do setor.
A alta rotatividade, de cerca de 30%, faz com que todos os anos abram-se 7.000 vagas, que costumavam sendo preenchidas por estrangeiros, principalmente romenos e búlgaros.
Parte desses trabalhadores voltou a seus países natais durante a pandemia e, com o divórcio entre os britânicos e a União Europeia, só podem se reempregar no Reino Unido com autorização de trabalho.
O novo sistema de imigração britânico, porém, prioriza funções de alta qualificação e melhor remuneração, enquanto as vagas nos frigoríficos são em geral de salário reduzido e pouco qualificadas. Com isso, faltam braços no setor de aves.
No maior fornecedor britânico de frangos para o varejo, o 2 Sisters Food Group, 16% das vagas estão ociosas por causa da perda de funcionários após o brexit, segundo a associação comercial.
Em média, o fornecimento de frango no Reino Unido sofreu uma queda de 5% a 10% desde o começo do ano, calcula o BPC, que neste mês pediu ao governo britânico uma flexibilização nas regras para trabalhadores estrangeiros do setor.
Não é uma lacuna fácil de preencher com funcionários britânicos, diz Luís Rua, diretor de Mercados da ABPA (Associação Brasileira de Proteína Animal): “Há empresas oferecendo até bonificação adicional, lutando na unha para ver se laça alguém para os frigoríficos, a desossa, mas o trabalhador inglês não quer essa função”.
O mercado britânico está entre os 15 principais para a avicultura nacional e em forte crescimento. De janeiro a julho deste ano, foram para o Reino Unido 39% mais toneladas que no mesmo período de 2020, um recorde em volume e faturamento dos últimos cinco anos, mostram os dados da ABPA.
Mas, embora a instabilidade no fornecimento de frango in natura no Reino Unido não deva ser resolvida tão cedo, ainda é cedo para estimar que oportunidade isso cria para o Brasil, diz Rua. Isso porque as principais exportações brasileiras para o país são de frango cozido ou salgado, que se destinam à indústria.
Na análise mais detalhada, em 2019 os brasileiros mandaram para o Reino Unido 67.689 toneladas desses dois produtos, quase 85% do total. O frango in natura –vendido também para o atacado e o varejo– foi só 1,6% do total, ou 1.276 toneladas.
Na competição pelos clientes britânicos, os brasileiros eram suplantados por vantagens obtidas pelos poloneses. A Polônia produz 1 em cada 6 frangos criados no continente e, quando o Reino Unido estava no mesmo mercado comum, os produtos poloneses não se submetiam a inspeção sanitária.
Essa situação muda a partir de 1º de outubro, quando exportações polonesas também serão fiscalizadas. Isso pode fazer a balança pender para o lado brasileiro, afirma Rua: a produção aviária polonesa tem registrado casos de Salmonella -uma bactéria que pode provocar intoxicação em humanos.
Quase 100 alertas foram emitidos entre março e julho deste ano por vários países europeus, de acordo com o portal Sistema de Alerta Rápido para Alimentos e Rações (RASFF), incluindo a presença, em aves resfriadas, de dois tipos considerados as principais ameaças para a saúde pública: Salmonella enteritidis e typhimurium.
Além de uma nova janela em relação ao frango in natura, o Brasil espera outra boa notícia: a ampliação de suas cotas de exportação sem tarifa para o Reino Unido, em negociação no âmbito da OMC (Organização Mundial do Comércio).
Antes do brexit, cada uma das oito categorias de frango vendidas pelo Brasil tinha uma cota para a União Europeia como um todo. Neste ano, elas foram divididas entre britânicos e o bloco europeu, mas o governo brasileiro quer aumentar a fatia do Reino Unido –que paga os melhores preços e cuja demanda supera o volume das cotas atuais.
Enquanto isso, novo problema se aproxima com o Natal. Cerca de 9 milhões de perus por ano são abatidos no Reino Unido nesta época, uma atividade que depende fortemente de mão de obra temporária, majoritariamente também do leste europeu.
A associação de produtores britânicos já projeta uma queda de 20% no número de aves disponíveis para as festas de fim de ano. Para o Brasil, pode ser uma chance de ampliar também as vendas de peru in natura, uma categoria cuja exportação não chegou a 450 toneladas (0,06% do total) em 2019.
Fonte: Yahoo Finanças